Ação Monitória: a constituição do título executivo e sua execução

Recentemente, celebramos 6 anos de vigência do novo Código de Processo Civil,  o qual foi amplamente recebido pela comunidade jurídica, havendo grande consenso quanto à sua interpretação. No entanto, ainda restam inúmeras divergências com relação à aplicação de institutos previstos no código e uma delas diz respeito à ação monitória, notadamente quanto à constituição do título executivo e sua execução. E é nesse contexto que o presente artigo pretende oferecer uma aplicação condizente com o procedimento monitório no CPC.

A ação monitória é uma espécie de procedimento especial à disposição daquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo extrajudicial, ter direito de exigir do devedor capaz: I) o pagamento de quantia em dinheiro; II) a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel; III) o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer. Portanto, trata-se de procedimento que prestigia a evidência do direito do autor, consubstanciado na prova escrita que instrui a inicial.

Preenchidos os requisitos da petição inicial (arts. 319 e 320 do CPC) e os específicos da ação monitória (art. 700 do CPC), bem como sendo evidente o direito do autor baseado na prova escrita, o juiz da causa deverá deferir a expedição de mandado monitório, no qual constará ordem de pagamento, entrega de coisa ou obrigação de fazer ou de não fazer, a depender do caso. O prazo para cumprimento da obrigação, além do pagamento de honorários advocatícios de cinco por cento do valor atribuído à causa, será de 15 (quinze) dias a contar da citação, podendo, no mesmo prazo, serem opostos embargos monitórios pelo réu.

Logo, são 3 (três) as possíveis atitudes do réu na ação monitória: I) cumprir espontaneamente a obrigação, no prazo de 15 (quinze) dias; II) opor embargos monitórios, seja quanto à integralidade ou parcela da obrigação; III) manter-se inerte, não cumprindo a obrigação nem opondo embargos, quando, então, será constituído de pleno direito o título executivo judicial. Interessa, para o presente artigo, a última situação.

Pois bem, dispõe o § 2º do art. 701 do CPC que “constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial, independentemente de qualquer formalidade, se não realizado o pagamento e não apresentados os embargos previstos no art. 702, observando-se, no que couber, o Título II do Livro I da Parte Especial”. Portanto, com a inércia do réu, haverá a conversão do mandado monitório em título executivo judicial, independentemente de qualquer formalidade. É com base nesse dispositivo que se pretende oferecer uma interpretação adequada do procedimento monitório.

A primeira questão é com relação à conversão do mandado monitório em título executivo judicial. Não obstante o código dispense expressamente qualquer formalidade, é “triste notar na prática forense a prolação de decisão judicial após a inércia do réu, em adoção de procedimento frontalmente contrário ao estabelecido em lei”[1]. Assim, equivoca-se a prática jurídica, pois o mandado monitório converte-se em título executivo judicial automaticamente, ou seja, de pleno direito, bastando que o réu se quede inerte. Afinal, o juiz, ao admitir a ação monitória proposta, já se manifestou quanto ao preenchimento dos seus requisitos e quanto à evidência do direito do autor, além da obrigação exigida pelo autor encontrar-se devidamente individualizada e estabelecida no mandado monitório, sendo desarrazoado novo pronunciamento judicial. Ademais, outra questão a ser lembrada é que na monitória o autor não formula pedido de reconhecimento de seu direito, mas simplesmente o cumprimento da obrigação constante na prova escrita, o que também torna equivocada a prolação de decisões após a inércia do réu.

A segunda questão é com relação à execução do título executivo judicial constituído com a inércia do réu. O § 2º do art. 701 do CPC deixa claro que o procedimento a ser observado é o do cumprimento de sentença. Diante dessa disposição, a prática forense majoritária entende ser necessária a intimação do réu para cumprir a obrigação constante no título, só sendo possível requerer sua execução forçada após o transcurso do prazo e diante de nova inércia do réu.

No entanto, entende-se ser também equivocada essa prática, porque referido dispositivo deixa a ressalva de que só serão observadas as normas ‘no que couber’, ou seja, no que for compatível com a ação monitória. Desta forma, a intimação do réu após a formação do título executivo judicial não pode ser considerada compatível com o procedimento monitório, pois ao réu já foi anteriormente concedido prazo adequado para cumprir sua obrigação, que somente permaneceu descumprida pela sua própria inatividade. Ao se reputar necessária a intimação do réu, esvazia-se a ação monitória e a constituição de pleno direito do título executivo acaba por ficar sem sentido, pois haveria um ‘bis in idem’ na concessão de prazo para cumprimento da obrigação por parte do réu, de modo que por duas vezes seguidas teria a oportunidade de cumprir a obrigação, inclusive sem qualquer sanção. Ademais, não é possível alegar ofensa ao contraditório e ampla defesa, porque houve citação válida e regular prévia, sendo também oportunizada a oposição de embargos monitórios – os quais permitem, aliás, a alegação de qualquer matéria passível de ser suscitada no procedimento comum –, apenas havendo a constituição do título executivo pela própria inércia do réu. Portanto, a constituição de pleno direito do título executivo judicial, por si só, já demonstra a resistência do demandado em cumprir com a obrigação.

Sendo o procedimento monitório concebido como técnica destinada a propiciar a aceleração da realização dos direitos, evitando os custos inerentes à demora do procedimento comum de um lado e desestimulando defesas infundadas e permitindo a tutela do direito sem delongas[2] de outro, a forma ideal de tratar o tema é que se prossiga o feito com “a possibilidade de a parte credora requerer, desde logo, as medidas que entender convenientes contra o devedor”[3], seja mediante penhora, remoção, imposição de multa, busca e apreensão, tudo a depender da obrigação a ser satisfeita. Somente assim prestigia-se a evidência do direito do autor, porque concede grande estímulo ao cumprimento espontâneo da obrigação quando do recebimento do mandado monitório e garante que, em caso de descumprimento, haverá sua execução forçada logo após constituição de pleno direito do título executivo, independente de intimação prévia.

De todo o exposto, pretende-se evidenciar que o procedimento monitório, nos casos em que há a inércia do réu, só se presta a garantir efetividade e celeridade quando interpretado em seu conjunto normativo. Logo, nesses casos, a ação monitória só se mostrará adequada quando for reconhecido ao autor a constituição de pleno direito do título executivo, independentemente de qualquer formalidade e pronunciamento judicial, somada a possibilidade de executá-lo forçadamente de imediato, prescindindo a intimação do réu.

  1. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 12ª ed. rev. atual. Salvador: JusPodivm, 2019, p. 1008.
  2. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil: tutela dos direitos mediante procedimentos diferenciados. 3 ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 247.
  3. DE AGUIAR JUNIOR, José Tito. Procedimento para execução do título judicial na ação monitória. Revista Consultor Jurídico, 2018. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-mar-21/jose-tito-procedimento-execução-titulo-ação-monitoria. Acesso em: 10 abr. 2020.

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